A tendência anti-woke que agora invade a cabeça da direita que finge pensar foi antecipada por Irma Vep. A minissérie de 8 episódios, produzida pelo estúdio indie A24 e exibida pela gigante HBO foi uma das maiores surpresas de 2022. Assayas retoma um de seus primeiros filmes, justamente intitulado Irma Vep (idem, 1996), onde ele acompanhava a produção de um filme baseado na personagem Irma Vep, criada pelo pioneiro do cinema francês Louis Feuillade, no seriado de matinê Les Vampires (1915-1916), interpelada pela femme fatale Musidora.
O seriado de 2022 representa a culminação de uma série de preocupações que perpassam a obra de Assayas. Filmes como Demonlover (idem, 2002), Acima das nuvens (Clouds of Sils Maria, 2014) e Personal Shopper (idem, 2016) abordam diretamente as transformações da cultura em um mundo globalizado, onde nacionalidades e culturas locais se dissolvem para formar um grande nada uniformizado. Demonlover é especialmente presciente nesse sentido, ao mostrar como a cultura japonesa, através de mangás e animes, se infiltra na França, e como a França, por sua vez, busca argumentos moralistas para tentar barrar essa cultura. Seguindo os passos de Enigma do Poder (New Rose Hotel, 1998), a adaptação de Abel Ferrara de um conto do autor cyberpunk William Gibson, o filme de Assayas é uma trama Neo Noir de espionagem industrial, suspense, e paranóia que tem no seu centro o gênero hentai de pornografia.
Nesse sentido, Assayas já percebia como a globalização instrumentalizaria a cultura como arma e, desde então, seus filmes e projetos de TV tem se preocupado cada vez mais com esse tipo de interação. Irma Vep não é diferente.