#AViaRomana
No seu livro, Rémi Brague revela uma Europa que não se mede pela originalidade, mas pela fidelidade às suas fontes
Há livros que nos fazem pensar. Outros, mais raros, nos fazem lembrar daquilo que nunca vivemos — e Europa, a via romana, de Rémi Brague, é exatamente esse tipo de livro: uma lembrança de uma memória que não é nossa, mas que grita em nós como um sangue antigo.
Sim, o livro é uma aula. Mas não daquelas em que o professor sobe no palanque e despeja fatos e datas em nossas cabeças. Brague, com seu francês elegante, vai construindo um raciocínio profundo para nos mostrar como os romanos absorveram a cultura estrangeira, sobretudo a grega antiga.

O que Rémi Brague faz é um milagre de lucidez. Ele nos mostra que Roma não foi apenas um império — foi um estilo de alma. Um gesto. Uma vocação para receber o outro, ouvir o estrangeiro e ainda assim manter o próprio nome gravado em pedra. A “via romana” de que ele fala não é uma estrada de pedras antigas. É uma estrada de espírito. E que estrada! A única, talvez, onde tradição e abertura caminham lado a lado, sem se anularem.
O gênio de Roma — e, por consequência, da Europa — não está na invenção, mas na transmissão. Brague nos lembra disso com uma delicadeza que constrange: o europeu, diz ele, é aquele que sabe que chegou depois, mas que, mesmo assim, tem algo a dizer. A cultura europeia não nasceu pronta — nasceu de uma ferida, de uma tradução, de uma entrega. E foi isso que a fez grande.
Roma é uma velha senhora que falava grego com sotaque latino, que copiou os deuses dos outros povos e construiu catedrais sobre ruínas. Nunca teve vergonha de ser herdeira — e isso, segundo Brague, é o segredo de sua eternidade. Quem sabe herdar, sabe durar.
Em Europa, a via romana, Rémi Brague nos devolve à Europa que não está nos arranha-céus de Frankfurt nem nas selfies de Paris. Ele nos devolve à Europa subterrânea, profunda, que ainda carrega nos ombros o peso da filosofia grega, da fé judaico-cristã e da prudência latina. Uma Europa que sabe que é grande não quando nega suas origens, mas quando se curva a elas.
____________
Europa, a via romana
Rémi Brague
Editora Mnēma, 2023
188 páginas
Excelente dica de leitura.Obrigada.
Gostei.