#BukeleVitalício
Em poucas horas, a Assembleia Legislativa de El Salvador aprovou uma reforma constitucional que permite a reeleição presidencial indefinida, mandatos de seis anos e fim do segundo turno nas eleições
Entre o poder das instituições e a vontade arbitrária de quem as ocupa, há um abismo moral, político e civilizacional. Esse abismo é frequentemente ignorado ou naturalizado, afinal, queremos soluções rápidas e radicais para nossos problemas.
Seja em El Salvador, no Brasil, ou mesmo nos EUA, em qualquer lugar onde a autoridade personalista começa a valer mais que a lei, os procedimentos e, até mesmo, que o bom senso, esse movimento é o mesmo: uma lenta corrosão do que verdadeiramente protege a todos: a lei e as instituições. O caso de Nayib Bukele explicita, de forma clara e simbólica, o rumo que muitos preferem ignorar, até que ele se torne irreversível.
Na noite de 31 de julho de 2025, o Congresso de El Salvador aprovou, com 57 votos a favor e apenas 3 contrários, uma reforma constitucional que permite a reeleição presidencial indefinida.
Além disso, estendeu a duração do mandato de cinco para seis anos, eliminou o segundo turno nas eleições e antecipou o fim do atual ciclo presidencial para 2027, sincronizando-o com as eleições legislativas e municipais.
A votação foi conduzida de forma relâmpago, os trâmites foram dispensados. Em curto, médio ou longo prazo é o tipo de fórmula que tem as mesmas consequências em qualquer lugar.
Segundo o jornal El Pais, a reforma aprofunda um movimento de concentração de poder que vem se intensificando desde 2021, quando a Assembleia Legislativa, sob controle do partido de Nayib Bukele, destituiu magistrados da Corte Suprema e o procurador-geral. Foi essa mesma Corte, já remodelada, que autorizou a primeira reeleição de Bukele, então proibida pela Constituição. Agora, com o novo texto aprovado, não há mais qualquer limite legal para que o presidente siga no cargo indefinidamente.
O governo justifica a mudança em nome da soberania popular. Os aliados de Bukele afirmam que a reforma dá ao povo o direito de escolher quem quiser, quantas vezes quiser, e que a unificação dos processos eleitorais permitirá uma economia de recursos e maior estabilidade. Vejam como isso é bom!!
Bukele, que goza de altos índices de aprovação, impulsionado por sua política de “mão dura” contra o crime, é apresentado como o líder que oferece ordem, resultados e controle em um país dominado por gangues.
A CNN do Chile destacou que a oposição denunciou a medida como um “golpe constitucional”. Parlamentares críticos afirmaram que “a democracia morreu em El Salvador” naquele momento, e que a reforma foi conduzida por um Congresso que agiu como se tivesse poder constituinte, sem consultar a sociedade, sem debate público e sem garantias de alternância. Afinal, certamente, quando essa oposição governava, a sociedade era consultada, o debate público era vigoroso e a democracia era uma fortaleza… por isso, o povo, cansado da boa vida que levava, escolheu um Bukele.
Organizações, como Human Rights Watch, compararam a situação com o que já aconteceu na Venezuela e Nicarágua. Em comum com seus vizinhos, El Salvador agora tem um Executivo que acumula poder sobre o Legislativo, o Judiciário e os órgãos de controle.
A história da América Latina é abundante em exemplos de como reformas feitas sob o discurso da vontade do povo, de salvar soberania, liberdade, democracia etc. acabaram abrindo caminho para a perpetuação de populistas e a degradação das instituições. Se antes El Salvador convivia com um governo horroroso que entregou o país para facções criminosas, agora tem um governo horroroso que também não parece disposto a fortalecer as instituições e, portanto, a sociedade para que não seja novamente dominada por outras facções. Dois erros nunca produzem um acerto.
Não difere muito do Brasil, onde supremo vira um colégio de Militantes, com governo de turno indicando aliados, e deputados com suas emendas perpetuando no poder,
As instituições na América Latrina se auto-implodem, o resultado é esse: um "ditador do bem" ou um "governo do amor" tanto faz, o estrago será o mesmo e sobrará invariavelmente na espinha dos manés.