[Leia a primeira parte do ensaio]
Por Rodrigo Duarte Garcia
Como toda experiência empírica – e aqui não seria diferente –, precisamos em primeiro lugar de uma cobaia. E para que não se levantem de cara maiores objeções, é evidente que essa cobaia tem obrigatoriamente de sair do cânone da literatura universal. Embora aleatória entre centenas de possibilidades, a ideia de escolher Guerra e Paz pareceu ideal. Liev Tolstói é o romancista por excelência e testar a investigação com uma de suas maiores obras seria o caminho natural a seguir; motivo mais do que suficiente para – ironic mode on – desconstruir Guerra e Paz na tentativa anunciada de encontrar aqueles substratos comuns que fundamentam um grande romance. Adiante, pois.
1. Enredo
Honestamente, não poderíamos começar por outro lugar. Até aproximadamente o Iluminismo, o enredo não era pressuposto exclusivo para que um livro fosse considerado bom. Era pressuposto para que um livro fosse escrito. Aristóteles já apontava que a ação por meio do incidente era a qualidade mais importante da tragédia: que história é essa, para que valha a pena ser contada? De batalhas excepcionais a duelos dramáticos e naufrágios em paisagens inóspitas, as melhores obras de ficção sempre foram feitas de coisas interessantes e extraordinárias, para além do cotidiano comum do homem. E, embora haja bons romances sobre assuntos insignificantes, o fato é que eles já começam a disputa em desvantagem, se comparados a outros de melhor enredo.
É simples assim: suponha que você tenha em mãos dois livros, sem saber nada dos respectivos autores e suas qualidades. Agora suponha que digam que o primeiro trata da perseguição a um enorme cachalote branco e, o segundo, das difíceis condições de uma comunidade de trabalhadores de carvão. Com honestidade, qual você escolheria?[1] De modo que, na largada em iguais condições, Zola já sai perdendo de Melville. E portanto: sim, a trama importa.