Tá amarrado, Palhaço!!!
Recentemente, assisti a trechos do Troféu Imprensa na esperança de ver alguma premiação dedicada ao humor. Pra minha surpresa, Carlos Alberto de Nobrega recebeu um Troféu Imprensa Pela História por conta de sua trajetória na TV.1
Fora isso, houve outra categoria dedicada a comediantes. Apenas. Mas, programa humorístico mesmo, só A Praça é Nossa. Provavelmente o motivo deste prêmio pra ele seja, justamente, porque não há programas de humor na TV brasileira atualmente.
Um programa que, apesar de ter mudado de nome e emissora ao longo do tempo, se mantém essencialmente o mesmo há quase 70 anos. Curioso, não? Não sobrou nenhum programa, seja de esquetes cômicas ou de costumes.
O humor sempre foi parte do DNA do brasileiro. Em todas as épocas desde que a TV chegou ao Brasil em 1950, havia vários programas humorísticos. Hoje, o único que sobrevive é justamente um programa de humor concebido naquela época.
A TV está numa crise tão brava que, pior que as demissões em massa, foi justamente a demissão da comédia. Óbvio que eu não estou esquecendo programas como o The Noite e Lady Night que tem momentos hilários. Mas são talk shows, não programas de humor como conhecemos.
Como a resposta é sempre o dinheiro, nós já sabemos quando foi e o motivo pelo qual o humor passou no RH. Hoje em dia, o humor até tá lá, mas não é contratado. Ele faz pequenas participações, trabalha como coadjuvante… Mas como protagonista, difícil.
Imaginei um documentário investigativo fictício, um mockumentary, chamado “CSI – Comédia Sumida: Investigação”. Uma equipe de investigadores procura os suspeitos de colocar em prática o plano de assassinar o humor. Os principais suspeitos são:
1. O Streaming – o assassino frio. O primeiro a ser interrogado seriam essas plataformas que chegaram com sotaque estrangeiro, produzindo séries gringas sem graça que ficaram ainda mais sem graça na versão brazuca.
2. O Politicamente Correto – o censor invisível. Outro suspeito é esse moleque descoladão de piercing e roupa colorida que vive dizendo: “Isso não pode mais. Isso ofende. Isso é capacitista, especista, glicofóbico...” Atualmente, pra contar uma piada na TV é necessário consultar um advogado, um antropólogo e um grupo focal com três minorias e uma samambaia. Na ânsia de eliminar um humor ofensivo e ultrapassado, cometeu excessos que acabaram sufocando o humor como um todo deixando ele na UTI.
3. O Executivo de TV – o serial killer do carisma. Esses são os que tiraram o TV Pirata do ar e colocaram o The Voice Kids apelando pra emoção barata. “Humor? Melhor fazer um reality onde famosos aprendem o quão difícil é fazer um risoto vegano de quinoa.” Eles acham que o público brasileiro quer menos risada e mais lágrimas em câmera lenta com trilha do Coldplay.
Talvez os culpados até sejam todos os suspeitos em conjunto, unidos silenciosamente por conveniência. Afinal, humor é uma parada que faz pensar demais e eles não querem muito que a audiência use a massa encefálica.
Como cancelar diretamente o humorista é coisa da internet — o famoso Ad Hominem — a solução mais eficiente foi exterminar a comédia de uma vez na TV. Nem o artista, nem essa arte seriam mais alvos, porque simplesmente deixariam de existir.
Hoje, o humor vive escondido no YouTube, tentando um improviso nos podcasts e tentando pagar o aluguel com cortes de 15 segundos no TikTok fugindo de palavras potencialmente problemáticas pra não comprometer a entrega do algoritmo.
Isso quando aquele conteúdo que deu um baita trabalho pra ser produzido, simplesmente é apagado ou restrito pela plataforma, demonetizando a produção e deixando o humorista fritando a cabeça atrás de algum técnico que resolva porque a plataforma não dá um caminho claro pra solução.
O humorista virou um exilado digital, condenado a gravar vídeos de cueca no banheiro, com o celular equilibrado num pacote de arroz, berrando tanto que o vizinho acha que é briga de casal e bate na porta.
Sabe o que eu acho pior? O público deixou isso acontecer. Ninguém tentou impedir. Não teve nem um “volta, humor!” Ou talvez o protesto tenha sido silencioso, sem histeria. Apenas deixando a TV de lado por que ficou sem graça pra ir atrás do humor pasteurizado da internet.
A última vez que alguém tentou fazer humor na televisão aberta, foi confundido com um quadro do Fantástico e substituído por uma matéria sobre a dieta do João Guilherme.
O humor televisivo ficou restrito ao side kick de um apresentador que ou não entende nada de humor ou entende, mas se borra de medo do humorista falar algo que desagrade o anunciante.
A comédia virou o rock n’ roll: já foi transgressora, hoje é esquecida. Virou trilha branca no YouTube — daquelas que tocam de fundo em vídeo de unboxing — porque é cool parecer meio rock n’ roll sem fazer barulho de verdade.
O humor também ficou chapa branca. O que vemos na internet não é mais comédia, é um conteúdo genericamente divertido, copiado, homogêneo, insosso, inodoro e incolor, feito pra agradar a todos, sem incomodar ninguém — e alcançar o maior número de cliques possível e não desagradar ao algoritmo.
É bem comum você entrar no perfil de alguém com 1.159 seguidores e ler na bio: Digital Influencer. Em breve veremos qualquer um se definindo como ‘humorista’, mesmo com postagens sem graça na timeline.
Mas veja você. Mesmo com essa prévia censura das plataformas travestida de aparente liberdade, o humor se mantém popular na internet. 46% dos brasileiros assistem a vídeos de humor no YouTube2 e 29% dos usuários de redes sociais no Brasil acessam essas plataformas para assistir a vídeos de humor, sendo essa uma das principais motivações de uso.3
Lembrando que a TV é uma concessão pública, ou seja, deveria oferecer o que é popular, por que então a TV não investe em comédia? Covardia. Simples e pura. As emissoras se tornaram reféns dos anunciantes e estes se tornaram reféns de uma minoria barulhenta que empunha a bandeira do politicamente correto desenfreado.
É óbvio que o politicamente correto tem a sua importância. Afinal, ninguém quer ver piada racista, sexista ou homofóbica na TV. O problema é que o cinismo faz com que qualquer piada que pareça ser dessa natureza, mesmo não sendo, seja rotulada como errada pra poder enjaular como vilã de filme de super-heroi.
Por enquanto, a comédia na TV está perdendo pro medo. A tentativa vai embora, a ousadia vai enfraquecendo, a criatividade vai minguando, os humoristas vão enfraquecendo e a arte vai perdendo o sentido.
Os batimentos cardíacos do humor na TV estão fracos. Ele sequer cabe mais no intervalo entre o Brasil Urgente e o Cidade Alerta. Ele foi demitido sem justa causa, sem rescisão, sendo obrigado a virar influencer.
Apesar disso, está lá, firme e forte na internet… esperando algum executivo que seja tão corajoso quanto ele produzir algo comicamente relevante na TV.
Se o humorista é resiliente, o humor é mais ainda. A comédia é SEMPRE o caminho mais curto para gerenciar uma crise.
É daí pra pior
Oscar,
Se tudo der errado, vamos abrir um puteiro? 😈
Eu estou firme no meu projeto “ CaindoForaDoDireito”, agora, modo “turbo”, mas, se não rolar, irei me enveredar por esse caminho 😹.
No mais, amei o texto! Principalmente, a parte do “ politicamente correto “ …chorei de rir com a “ samambaia “ 😸. Assino embaixo.
Sigo firme e não abro…adoro tanto o humor quanto o rock. Sigam resilientes, afinal, o que a vida espera da gente, parafraseando o Guimarães Rosa, é coragem! 💪🏻🤗🥃
Sou fã do trabalho de vocês!