#EscolhasTrágicas
Sobre "O Passageiro" e "Stella Maris", as últimas obras-primas de Cormac McCarthy
"Toda realidade é perda, e toda perda é eterna."
Cormac McCarthy, O Passageiro
O ano é 1946. O então o médico, farmacologista e químico Heinrich Muckter torna-se chefe de pesquisa da empresa farmacêutica Chemie Grunenthal; lá ele irá desenvolver um novo medicamento, a talidomida. O medicamento é comercializado para tratamento de insônia e especialmente para combater os enjoos matinais durante a gravidez. Em outubro de 1957, a talidomida começa a ser vendida e torna-se um sucesso, é o segundo medicamento mais vendido na Alemanha, perdendo apenas para a aspirina criada pela Bayer.
Comercializada como sedativo, a campanha de marketing enfatizava os poucos riscos do medicamento, garantindo sua eficácia e segurança. Rapidamente a talidomida ganhou o mundo, sendo comercializada em mais de 46 países. Mas no final dos anos 60, começaram a aparecer casos de más-formações congênitas onde os bebês nasciam com focomelia, uma anomalia congênita que impede a formação normal de braços e pernas. Caracteriza-se pelo encurtamento dos membros do feto tornando-os semelhantes aos de uma foca. Em 1962 já havia mais de 10 mil casos de crianças nascidas com defeitos congênitos provenientes do uso da talidomida. Nos anos seguintes, estima-se que mais de 20 mil bebês nasceram mutilados e 80 mil foram mortos pelo uso da talidomida. Adultos que tomaram o remédio tiveram severos danos nos nervos.
Ainda em 1959, uma série de reclamações de médicos alemães e distribuidores de talidomida começou a chegar aos ouvidos dos executivos e cientistas da farmacêutica. A Chemie-Grunenthal tinha uma resposta padrão: “É a primeira vez que ouvimos falar de algo assim.”