#interludio: A Tradição da Grande Melodia
Edmund Burke foi o nosso Virgílio nos labirintos da ideologia política
They understood that wisdom comes of beggary.
W.B.Yeats, “The seven sages”
A reedição brasileira de um livro como As ideias conservadoras (novamente) explicadas a revolucionários e reacionários (Editora Almedina), de João Pereira Coutinho, é de grande importância para o nosso mundo intelectual não porque o autor seja meu amigo (afinal, somos obrigados a fazer full disclosure de nossas relações em homenagem à honestidade intelectual que nos une), mas sim porque o seu assunto, mesmo que pareça cifrado ou distante demais do nosso cotidiano, é essencial para que se entenda as engrenagens políticas que estão em jogo, seja no aspecto nacional como internacional.
O tópico sobre qual é o significado destas palavras repletas de insinuações maliciosas – conservadorismo, conservador, reacionário, fascista – chegou a tal ponto de incompreensão, para não dizer de estultice, que a mera leitura de algumas páginas deste pequeno e elegante volume é uma lufada de ar fresco em um debate que não existe mais – e, se alguma vez existiu, é certeza de que já começou viciado.
João Pereira Coutinho tem um estilo claro, direto que, sobretudo, não banaliza o assunto – muito pelo contrário, ele faz algo improvável para um livro de apenas 107 páginas: contribui com novas ideias, faz o leitor pensar em novas perspectivas e, mais, o retira daquela zona de conforto da qual a suposta “nova direita” tupiniquim sempre caiu, constituída no binômio maniqueísta do “nós” contra “eles” quando, na verdade, todos estão no mesmo barco e ignoram se rumam ou não rumo a um naufrágio.
Todavia, ao mesmo tempo, o livro apresenta um problema, cuja culpa não é sua ou a de seu autor, mas sim do leitor que irá encarar suas linhas. A pergunta que ficará para este sujeito será a seguinte: E o que eu tenho a ver com isso? Porque o livro não dialoga – e nem é mesmo a sua intenção primeira – com o público brasileiro, sequer o lusitano, apesar de ser escrito justamente na língua de ambos os países. O seu público é o anglo-saxão – e isto não é uma má notícia. Pelo contrário: Pereira Coutinho nos apresenta a um mundo que todos nós deveríamos ter acesso – e que foi infelizmente negado por causa de anos de lobotomia em uma cultura da estupidez institucionalizada. E quando falo de “mundo anglo-saxão”, não estou a falar de The Smiths, Echo & The Bunnymen, Lennon & McCartney e Monty Phyton; falo do filósofo Roger Scruton, do cientista político Anthony Quinton, do grande Michael Oakeshott – e do honorável Sir Edmund Burke (1729-1797), considerado o pai do conservadorismo e, no caso de Pereira Coutinho, “o seu Virgílio nos labirintos da ideologia política”.