Por Tobias Goulão
Na Espanha da virada do século XIX para o XX, um grupo de intelectuais de expressão pela produção e idéias defendidas fizeram história. A chamada “geração de 1898” contou com grandes nomes das letras espanholas e possuíam por característica uma erudição profunda, crítica freqüente aos problemas sociais e políticos, produção de um vasto número de periódicos, ensaios e literatura em geral. Não seria nenhum exagero dizer que desse grupo, que contava com o famoso Miguel de Unamuno, Azorín e Pío Baroja, houve um novo florescimento da atividade intelectual na Espanha. O mais fecundo resultado da geração de 98 não pertencia a ela temporalmente, mas em espírito devido a sua preocupação com seu país, é quando colocamos diante de nós aquilo que se destaca para além das terras da Hispania: o filósofo José Ortega y Gasset.
Ortega y Gasset, nascido aos 9 de maio de 1883, Madrid, Espanha, vindo a falecer na mesma localidade aos 18 de outubro de 1955, levantou-se como um dos grandes nomes que movimentaram a filosofia do século XX. Com sua influência neo-kantiana e fenomenológica, mas não preso a elas, conseguiu produzir uma leitura sobre as questões que circundavam sua pessoa. Sendo um intelectual que escreveu sobre vários temas e desempenhou funções como teórico social, crítico cultural, ensaísta, político e editor. A sua metodologia para a sua observação filosófica é segundo a razão vital, ou seja, a própria condição da vida humana como meio para conhecer, observar e responder aos inquéritos aos quais estamos expostos. A vida humana em si está nos oferecendo, a todo instante, caminhos a serem seguidos, escolhas e tudo isso é carregado de informação. A partir da percepção que tenho, compreendendo e interpreto o mundo, que é parte de mim como sou parte dele, e toda uma série de informações que ganham profundidade se tornam meios para respondermos às circunstâncias as quais estamos entregues e das quais não podemos ter outra reação a não ser salvá-las. Conhecer e interpretar o mundo dentro das circunstâncias é a atividade do filósofo, que busca o significado daquilo que o mundo é, e com isso significar a nossa vida, ter uma resposta para nosso agir, corresponder à batalha na qual lutamos cotidianamente.
Um dos trabalhos mais conhecidos de José Ortega y Gasset é o livro A Rebelião das Massas. Publicado em 1930, possui hoje no Brasil uma nova edição completa realizada pela Vide Editorial, que além do texto original de Ortega, consta também com um “Prólogo para franceses”, um “Epílogo para ingleses”, um “Apêndice” e o um excelente ensaio de “Introdução” escrito pelo discípulo mais próximo do autor, Julián Marías, que expõe todos os pontos pelos quais o livro é importante. A reunião de todos esses textos sobre essa edição lançada no Brasil é uma ótima forma de melhor compreender o trabalho realizado por Ortega e evitar o equívoco que gerou em muitos leitores colocando o autor dentro de certos espectros no campo político e uma interpretação reduzida de sua atividade de filósofo, o que o fez ser visto muitas vezes como um “pensador” ou qualquer outra coisa senão um amante da sabedoria. É como próprio Ortega deixa claro para os franceses, ao escrever sobre a discussão política acerca de seu livro: que “ser de esquerda, como ser de direita, é uma das infinitas maneiras que o homem pode eleger para ser um imbecil: ambas são, de fato, formas de hemiplegia moral” (p.61). Já sobre a atividade filosófica, demanda o trabalho de ler e meditar toda a obra, o que parece ser impedido pela escrita clara que parece revelar de imediato sua profundidade. Mas acontece que estamos diante de um lago cristalino cujos raios solares nos enganam sobre seu fundo.