Por Alexandre Janssen
I.
Em uma entrevista ao New York Times às vésperas do lançamento da segunda parte da última temporada da sua série mundialmente bem sucedida, The Crown, Peter Morgan, seu criador e redator, citou uma frase da escritora e crítica literária Hilary Mantel, ao discorrer sobre alguns questionamentos dos críticos sobretudo nas duas últimas temporadas referentes a imprecisões históricas e inserções de diálogos ficcionais durante a narrativa: ”História não é o passado, mas consiste em ser um método que desenvolvemos para organizar nossa ignorância do passado.”
Desde os anos 1990, Morgan vem contando suas histórias em séries de tv e filmes. Entre elas, ganhou notoriedade em 2003 com o filme The Deal, contando sobre um acordo realizado em um restaurante em 1994 entre os rivais e membros do partido trabalhista britânico, Tony Blair (futuro primeiro ministro em 1997) e Gordon Brown (que o sucedeu em Downing Street em 2007). Seus interesses sobre os eventos envolvendo Tony Blair continuaram e, em 2006, ele lançou o filme The Queen, que retrata o episódio da morte da Princesa Diana em 1997.
Peter Morgan nos mostra esse fato e isso pode ser lido também no livro do filme, mediante a recepção da notícia e suas consequências desde o gabinete do primeiro-ministro até o castelo de Balmorral, tradicional residência escocesa de férias da família real. Lá a Rainha Elizabeth II recebe a notícia e, com ela, acompanhamos diversos conflitos que ressoam a partir do trágico acidente automobilístico ocorrido em Paris. Nesse premiadíssimo filme, vencedor de melhor roteiro no Globo de Ouro e que concedeu Oscar para Helen Mirren como melhor atriz no papel de Elizabeth II, encontramos os recursos criticados nas últimas temporadas da aclamada série do Netflix. A rainha conversa com a sua versão mais jovem; além disso também se coloca em momento reflexivo durante um atolamento de seu jipe enquanto segue no impasse de retornar ou não à Inglaterra para o funeral da mãe de seus netos. Aqui poderíamos questionar se a veracidade desses fatos, que comprometeriam a história que está sendo contada, tiraria seu brilho e credibilidade.