– por Pedro de Almendra
Várias vias podem ser adotadas para que se interprete o drama de Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) em Coringa (2019): se, por um lado, pode-se focar nos problemas psicológicos do personagem e resolver o filme com um diagnóstico clínico e uma citação de Freud, por outro, igualmente válido, pode-se dar ênfase à sociedade à qual ele pertence e arriscar uma crítica à economia de mercado. Ambas as abordagens, a psicológica e a sociológica, apesar de justificáveis, atingem, quando muito, uma sugestão, algo convincente, mas insatisfatória. Nenhum desses problemas, acredito, ocupa um lugar realmente central no filme e aparecem, por vezes, de modo um tanto caricatural, beirando o substituível, o descartável: ratos gigantes, risos involuntários, elite cruel, etc. O lugar que ocupam aqui é, antes, o de moldura; servem de ocasião e não de motor ao drama.
Todas as tensões do universo de Coringa condensam-se no destino individual do protagonista e resolvem-se, juntas, em um só gesto.