#interludio: O Controle Do Universo
Sobre "Ferrari", a obra-prima tardia de Michael Mann
Por Leandro Costa
"primeiro imagens
mas aquelas
de que fala São Paulo
e que são uma morte
portanto uma ressurreição"
Jean-Luc Godard
"E tudo o que era vago
toda frouxa matéria
para quem sofre a faca
ganha nervos, arestas".
João Cabral de Melo Neto
*
Décimo segundo filme de uma filmografia que conta com algumas obras-primas, Ferrari pode muito bem ser inscrito entre as melhores produções de Michael Mann.
É a expressão da maturidade artística do cineasta. A síntese de uma consciência formal que foi se aprimorando com o tempo até atingir o seu ápice de poder e de concentração.
Em Ferrari, a câmera de Mann apresenta uma precisão primorosa: uma câmera que reconhece o valor de cada corpo e de cada objeto que filma, que confere-lhes a densidade necessária para que não sejam meras ilustrações de uma narrativa, mas artefatos carregados de emoção, de utilidade e de poder significativo.
Nervos e arestas
Enzo Ferrari está dentro do mausoléu do seu filho morto. Vemos o personagem sentado, num eixo vertical. Um corte revela-nos a expressão da sua face vista de outra perspectiva. Ele chora, suas veias estão tensionadas. De repente a sua expressão se altera. Contrariando as convenções, o plano tem a mesma dimensão do plano anterior, apenas o ângulo é diferente. Por que, então, há essa mudança de olhar?