#interludio: O Mito Da Inovação
Há uma dinâmica peculiar entre as hierarquias corporativas e as redes sociais
Com o anúncio feito nesta semana por Donald Trump de que o Departamento de Eficiência Governamental (ou DOGE) será liderado por Elon Musk, a palavra da moda voltará a ser inovação.
Há, porém, um problema: ninguém sabe muito bem o que ela significa - e quais são as suas implicações morais.
Vamos a um exemplo: em The Square and the Tower (“A Praça e a Torre”, como foi traduzido por aqui pela Editora Crítica), admirável livro sobre o atualíssimo conflito entre as redes sociais e as hierarquias corporativas, o historiador Niall Ferguson suspende o seu panorama narrativo para nos contar uma anedota.
Trata-se dos encontros entre a poetisa russa Anna Akhmátova e o filósofo de Oxford (então adido na embaixada britânica na União Soviética stalinista) Isaiah Berlin, ocorridos entre 1945 e 1946. Foram conversas longas, castas e que falaram sobre tudo o que importa, de literatura às artes plásticas, menos de política. Contudo, não foi assim que Stalin pensou. No ápice do seu poder, ele acreditava que a reunião daqueles dois só podia significar uma oposição ao seu governo tirânico. Não estava errado — e, por isso mesmo, mandou cercear ainda mais o círculo de amizades de Akhmátova e ordenou, logo depois, a prisão do filho dela pela segunda vez (a primeira foi em 1938).
As conversas entre o filósofo e a poetisa são, segundo Ferguson, os exemplos concretos da subversão política que fundamenta as conexões informais das redes sociais. Ao contrário do que muitos imaginam nesses tempos de Facebook, Twitter e Instagram, elas não existiam só porque Silicon Valley assim quis. Na verdade, as redes sociais são uma constante na história da Civilização Ocidental. Elas podem ser encontradas desde as sociedades secretas (como os Illuminati e os Rosa-Cruzes, incapazes de criar alguma conspiração política, como muitos supõem, mas fundamentais para estabelecerem uma estrutura flexível de informação) à mudança de pensamento provocada pela criação da imprensa por Gutenberg (e, posteriormente, pela revolução religiosa atiçada por Martinho Lutero), passando pela era das Grandes Navegações (que criaram, para o bem ou para o mal, a nossa noção do mundo globalizado).