*Por Adaubam Pires
A história é sabida: em janeiro de 1817, após uma cansativa travessia dos Apeninos, Stendhal estava ansioso para chegar logo a Florença. No livro Rome, Naples et Florence, crônica de suas viagens entre 1816 e 1817 pelas célebres cidades italianas, Stendhal registra na entrada de 22 de janeiro:
Enquanto descia dos altos Apeninos para Florença, o coração batia descontroladamente em meu peito. Que infantil excitação! Finalmente, numa súbita curva da estrada, o meu olhar mergulhou no coração da planície e lá, ao longe, como uma massa penumbrosa, pude distinguir a pilha de Santa Maria del Fiore com sua famosa Cúpula, a obra-prima de Brunelleschi.
Pela porta San Gallo, Stendhal entra na tão sonhada Florença. Afobado, segue pelas ruas a pé, compra um guia da cidade, pede direções aos transeuntes e, por fim, vê-se diante do seu destino: a Basílica de Santa Croce.
No interior da basílica ancestral, admira os túmulos de Michelangelo, Alfieri, Maquiavel e Galileu. Um monge se aproxima e Stendhal pede que lhe abrisse a capela Niccolini, em cujo teto se encontram os afrescos de Volterrano. O religioso o atende e deixa-o lá sozinho. Sentado no banco de rezar, olhando para o teto, com a cabeça apoiada no encosto anterior, Stendhal deslumbra-se com a “Coroação da Virgem”. Na base do afresco, as Sibilas de Volterrano causam-lhe uma poderosa impressão: “a mais profunda experiência extática que, até onde sei, já experimentei por meio da arte de um pintor.”