#JustiçaParaTodos
A semana foi marcada pelo falecimento da simpática e célebre figura do juiz Frank Caprio
A qualidade da misericórdia não é forçada.
William Shakespeare
Shakespeare, sempre ele! Na peça O Mercador de Veneza, Pórcia abre o Ato IV com o argumento de que a misericórdia deve ser espontânea, como um atributo divino. Defende que deve ser voluntária, por ser uma força natural que abençoa tanto aquele que a concede quanto aquele que a recebe.
A semana que passou foi marcada pelo falecimento da simpática e célebre figura do juiz Frank Caprio (1936-2025), protagonista central em vídeos que retratam cenas de julgamento de uma corte municipal. Os vídeos, que ultrapassaram a marca de um bilhão de visualizações, cativam pela forma natural como os depoentes se expressam. Uma mistura de inocência em sua forma pura e de malandragem primária (logo desmascarada pela corte), que tenta justificar deslizes, pecadilhos e conflitos. Ao final do julgamento, há sempre uma moral positiva, uma promessa comprometedora, um arrependimento singelo.
O juiz Caprio, no papel principal, encarna a estampa da misericórdia e do justo juízo. Nele – e em seus julgamentos – convergem as verdades fundacionais dos Estados Unidos:
que todos os homens são criados iguais, que são dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis; que entre estes estão a Vida, a Liberdade e a busca da Felicidade.
Homenageando a cidade em que nasceu e viveu, uma vez que o programa usa as imagens de sua corte municipal, deu-lhe o sugestivo nome de Caught in Providence (Apanhados em Providence). A cidade de Providence, localizada no estado de Rhode Island, é um estuário que forma uma baía portuária de grande extensão, denominada Baía Narragansett. É uma das mais antigas cidades americanas.
Providence nasceu pelas mãos do pastor Roger Williams, dissidente religioso dos puritanos da colônia estabelecida em Massachusetts. Williams foi considerado herege por defender a separação da Igreja e do Estado e por condenar a forma como os colonos se apropriavam das terras indígenas. Banido de sua comunidade, o pastor dissidente encontrou guarida entre os índios Narragansett, onde pacificamente instalou o grupo que o acompanhava no exílio. Como forma de reconhecer a providência divina no centro de suas adversidades, o pastor Williams assim a batizou. Professava a fé de que Deus, em sua misericórdia, jamais abandona os seus.
É assim que o Apanhados em Providence tem duplo sentido para os americanos. Brinca com o flagrante de ser pego na infração da lei, enquanto permite uma interpretação adicional: estar frente a frente com o juiz Caprio significa dar oportunidade para a providência divina (ou a fortuna, se preferir).
Em sua vocação de juiz municipal, Frank Caprio traz um caráter múltiplo: severo, porém generoso; enérgico, porém didático. Generoso pelo profundo olhar humano, carregando empatia para com o outro, sem usurpar da justiça e sem fazer pouco caso da severidade da lei. Didático por usar a misericórdia como instrumento pedagógico, servindo de exemplo não só aos infratores, mas também a julgadores do mundo todo.
Revelando esse equilíbrio entre os antagonismos, o juiz Caprio é a demonstração máxima do que deve servir a lei e a justiça: não como um fim em si mesmas, mas como meios indispensáveis para construir e manter a sociedade como expressão de convívio civil, respeitoso e justo.
Esperemos, que juízes dos diferentes tribunais pelo mundo afora (inclusive no Brasil, desde o menor até o superior), venerem seu exemplo, reconhecendo que , acima do julgador e das pessoas julgadas, há o mover da providência. E assim, com humildade, aceitar que ela atua livremente, sem barreiras a detê-la.
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Como fazem falta os juízes justos...
Hoje muitos deles, principalmente nas altas instâncias, querem ser políticos e, em razão desta opção, deixam, propositalmente, de ser justos.