#Livros: A esperança na condição humana
André Malraux afirma uma esperança trágica: a de que, mesmo em ruínas, o homem possa escolher não se calar diante da história.
A guerra, em André Malraux, nunca é apenas um conflito armado. Ela é o lugar onde a existência perde suas desculpas e o homem se vê obrigado a responder por si mesmo. Em A Esperança, a Guerra Civil Espanhola surge como um laboratório trágico do século XX, onde ideologias se chocam, mas indivíduos descobrem que a história não é um palco abstrato, ela exige presença, risco e decisão. A esperança do título não anuncia vitória; anuncia resistência à anulação.

O romance recusa o heroísmo retórico. Seus personagens são frágeis, contraditórios, frequentemente derrotados, mas unidos por uma intuição comum: agir é a única forma de não consentir com o absurdo. Malraux descreve a fraternidade improvável entre camponeses, operários, intelectuais e militantes como um gesto precário, sempre ameaçado, mas ainda assim necessário. O combate não redime o mundo: impede apenas que ele se entregue sem luta à barbárie.
Essa visão já estava plenamente formulada em A Condição Humana, ambientado na Revolução Chinesa. Ali, o homem aparece isolado diante da morte, condenado a agir sem garantias metafísicas ou morais. A revolução não oferece salvação, apenas intensidade. Em A Esperança, essa condição permanece, mas ganha dimensão coletiva: a solidão existencial não desaparece, mas é compartilhada. A esperança nasce menos da ideologia do que da comunhão no risco.
Nos dois livros, Malraux constrói uma ética sem consolo. Não há promessa de sentido último, nem fé no progresso automático da história. O que existe é a recusa da passividade. A ação política não justifica o homem; ela o expõe. Mas é justamente nessa exposição que se preserva algo essencial: a dignidade de não se deixar reduzir a espectador do próprio tempo.
Assim, a obra de André Malraux propõe uma definição austera de esperança. Esperar não é acreditar no triunfo, mas persistir na ação mesmo quando a derrota é provável. Contra o cinismo e contra o fanatismo, Malraux afirma uma esperança trágica: a de que, mesmo em ruínas, o homem possa escolher não se calar diante da história. É, enfim, uma boa lição para os nossos dias de promiscuidades político-ideológicas.
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A Esperança
André Malraux
Record, 2000
Tradução de Eliana Aguiar
478 páginas
A Condição Humana
André Malraux
Best Seller, 2009.
350 páginas




