Um dos últimos filmes que vi no final de 2023 foi A resistência (The Creator, 2023), de Gareth Edwards. Tentei ver o longa no cinema mas, como é comum comigo, não deu tempo. De todo jeito, eu estava bastante ansioso para assisti-lo por ser o retorno de Edwards à telona. Seu último filme foi Rogue One: Uma História Star Wars (Rogue One: A Star Wars Story, 2016) e, desde então, pouco foi noticiado sobre o que ele estava fazendo - se é que ele estava fazendo algo no cinema.
Eu acompanho a carreira de Edwards desde que seu primeiro filme, Monstros (Monsters, 2010), fez barulho em festivais e certas publicações de cinema. Trata-se de um longa de ficção-científica e horror que foi produzido por módicos 500 mil dólares (e fez quase 5 milhões nas bilheterias). Edwards escreveu, fotografou, cenografou e, por fim, dirigiu o filme com uma equipe de 6 pessoas ao longo de três semanas em cinco países diferentes. Com uma linguagem câmera na mão, ao melhor estilo cinema verité (lembra muito o trabalho de Paul Greengrass, outro inglês oriundo de documentários de TV - assim como Edwards, diga-se de passagem).
Monstros se passa em um mundo que está sendo invadido por alienígenas gigantescos (que lembram um pouco os trípodes de Guerra dos Mundos) que parecem estar em conflito entre si - e com militares humanos que os estão atacando. A narrativa acompanha um fotojornalista (interpretado por Scott McNairy, num papel que o alçaria à fama) que é enviado ao meio do conflito com a missão de resgatar a filha do dono da empresa para qual ele trabalha. A partir desse ponto de vista reduzido e restrito, e com uma linguagem documental, já podemos perceber aqui uma das grandes marcas do cinema de Edwards: a escala. Apesar do foco ser no drama humano, e o conflito entre monstros e exército e tudo o mais ser distante, o fato é que Edwards se usa dessas restrições para mostrar a insignificância e a própria pequenez do ser humano diante de criaturas que são completamente estranhas e distantes deles. Os alienígenas de Monstros sequer parecem perceber que existem seres humanos em volta deles.
Com essa estrutura de jornada, e uma trama que exige certa grandiosidade de efeitos especiais e produção, é extraordinário o feito de Edwards em transformar suas limitações em força. É uma trama que move rapidamente por múltiplas locações e situações e onde cada dólar do seu reduzido orçamento é espremido e colocado na tela (e vale lembrar que Edwards rodou com um espírito de guerrilha, inclusive filmando em locações onde a equipe não tinha autorização para filmar).
O filme foi muito bem-vindo não só por ser um extraordinário triunfo artístico e técnico, mas também pelo fato de que podemos inseri-lo claramente num tipo de ficção-científica e horror européia que viu seu auge nos anos 60 e 70, mas que, com o sucesso da ópera espacial de George Lucas em 1977, se viu gradualmente colocada de escanteio. A obra de Evans remonta aos livros de Robert Heinlein, Philip K. Dick, Arthur C. Clarke, H. P. Lovecraft, Walter M. Miller e, principalmente, Arkádi e Boris Strugátski, a dupla de irmãos responsável por Piquenique na estrada (1971). Com sua típica reserva inglesa, Edwards evita melodrama e tom de Monstros é mais contido, até mesmo distante, quase contemplativo e, com isso, no âmbito do cinema, Monstros está muito mais próximo de filmes como Distrito 9 (District 9, 2009, de Neill Blomkamp) do que outros blockbusters do mesmo período.