O delegado de Polícia de Petrópolis, José de Morais Rattes, havia sido chamado para comparecer à rua Gonçalves Dias, número 34. A empregada da casa, Dulce, estranhou que, às quatro da tarde, seus patrões, não tivessem despertado. Preocupada, abriu a porta do quarto, e se assustou com a cena.
Nas duas camas de solteiro unidas, o casal ocupava o lado esquerdo. Ele trajando calça, camisa e gravata preta alinhada. Ela com roupa leve, o relógio no pulso esquerdo. Apertando o pequeno espaço, os corpos estavam inertes, ela com o braço envolto em seu pescoço. Ele com uma feição serena.
Os corpos rígidos, sem vida.
O suicídio de Stefan Zweig (1881-1942) foi um ato meticulosamente planejado[i], dada a quantidade de cartas e instruções que deixara. Sua segunda esposa, Lotte (Charlotte Elizabeth Altmann), fiel companheira e expediente assistente, participou do ato extremo.
Naquela madrugada de fevereiro, o famoso escritor austríaco, resoluto em colocar um fim em sua existência, alcançou seu intento. Não aguentava o peso de sua contínua depressão, fruto de desilusão com o mundo e com a vida. O regime nazista levara a Europa à guerra. O preconceito e as hostilidades contra os judeus alcançaram proporções cruéis e não imaginadas. O amanhã prenunciava-se sombrio demais para si. Uma longa noite escura se abateu sobre Zweig.
Na primeira vez que por aqui aportou, em 1936, imediatamente se apaixonou por nossa terra e, aos poucos, foi descobrindo do que nós, brasileiros, éramos feitos, e isso em seu melhor sentido. Fugindo da Áustria, experimentou diferentes lugares para minimizar os efeitos de seu exílio. Deixou os Estados Unidos e, vindo para o Rio de Janeiro, em 1941, escolheu Petrópolis como seu lar. Ao subir a serra contemplou a paisagem, contemporizou o calor. Escolheu uma modesta casa que lhe serviria em dupla função: residir e continuar seu profícuo processo criativo de escrita.
Por causa de sua paixão por nossa terra, escreveu Brasil, um País do Futuro. Trata-se de uma obra não muito extensa, uma narrativa elogiosa que dá tons de expectativa otimista, em constante condicionante ao tempo futuro. Mas não deixa de ser uma ode ao povo e à pátria que o recebera em refúgio. E, ao final, iria sepultá-lo.
O texto é uma referência para nós brasileiros. Trata-se de um olhar estrangeiro, de um outsider, decepcionado com o Velho Mundo, que se apaixonou pelo Brasil e por sua gente.