A precisão conceitual, filosófica e histórica da imprensa me comove. A revista Exame conseguiu publicar um texto autorrefutável: "Por que o aniversário de São Paulo é comemorado no dia 25 de janeiro? Veja a origem da data."
Curiosamente, a resposta usa o termo "fundação" no sentido tradicional de estabelecimento de um novo assentamento. No caso de São Paulo, ou mais precisamente, São Paulo dos Campos de Piratininga, os jesuítas estabeleceram um núcleo missionário em 1554. Portanto, São Paulo, enquanto cidade, não existia. Logo, sua "fundação", pelos missionários jesuítas, deu início àquele povoado, em virtude de um centro de atividades religiosas e educacionais mais conhecido como “Pátio do Colégio”, ou por suas velhas paredes de taipa.
Mas por que o aniversário de São Paulo é no dia 25 de janeiro? Segundo a Exame:
Como pode uma cidade que ainda não existia ter sido tomada pelos missionários que a fundaram?
A ideia de “tomada” tem um objetivo ideológico aqui: induzir a uma interpretação equivocada que nos faz pensar em “apropriação à força”, um ato militar por parte dos religiosos.
O cenário é idílico: viviam ali na região povos originários, bonzinhos e contentes, em harmonia com a natureza, sem pudores com a nudez, sem metafísica demais na consciência. A imagem perfeita do “bom selvagem” do velho Rousseau. Aí, de repente, chegaram os missionários jesuítas, um bando de europeus brancos, munidos de Bíblia, crucifixos e orações para tomar a cidade que eles mesmos fundaram.
Historicamente, não houve uma "tomada" no sentido de uma conquista militar pelos jesuítas. Para ser honesto com a complexa dinâmica dos fatos e da natureza humana, quem quis tomar a vila militarmente foram os índios guaianás e carijós, que não gostaram nadinha da aliança entre Tibiriçá (um líder tupiniquim) com os jesuítas. No episódio conhecido como Cerco de Piratininga, emplumados com seus trajes militares, guaianás e carijós entoavam o grito de guerra: jukaí karaíba (morte aos portugueses)!
Concorde ou não com ela, a missão dos jesuítas era de natureza espiritual e educacional, não militar. E, cá entre nós, não há nada mais importante para um ser humano, seja ele tupi, tupinambá, guarani, yanomami, kayapó, pataxó ou xingu, do que conhecer a palavra e a misericórdia de Jesus Cristo.
Hoje, dia 25 de janeiro, além do aniversário da cidade, é a data em que se celebra a conversão de Paulo. Este evento é considerado um dos momentos mais significativos no cristianismo, pois marca a transformação de Saulo, este sim, um perseguidor dos cristãos, em São Paulo, um apóstolo de Cristo.
"Sem metafísica demais na consciência", hehehe. Muito bom. Curiosamente, estou lendo o livro A Companion to Ethics. O primeiro artigo é de Mary Midgley. O tema do artigo dela é falar de onde ver a ética. A autora rodeou muito, mas não sabe responder. Ninguém sabe. Mas os indígenas brasileiros não tinham metafísica na cabeça, hehehe.
Ótimo texto. Obrigado. Viva os jesuítas que criaram São Paulo!
Obrigada, Francisco Razzo! Texto impecável!
Adorei a recordação do Pátio do Colégio, ponto importante na história da cidade que amo!
Essa revista precisa revisar essa porcaria que escreveram! Que lixo!
Novamente obrigada e parabéns, amei seu conhecimento e seu texto! 🙌