#Obrigado,Platão
Aloizio Mercadante resolveu puxar o saco de Alexandre de Moraes com um texto hermético, mas cheio de erros
Um petista puxando o saco de Alexandre de Moraes. Até aí, nada de novo. O problema foi fazer isso com todo o apelo afetado da erudição. Começou com Werner Jaeger, passou por Platão, tropeçou em Hegel e terminou em Moraes como herói civilizatório.
O raciocínio é simplista e tolo. A democracia depende de uma cidadania bem formada. Essa formação, segundo ele, está em colapso. Vivemos, portanto, uma era de “anti-Paideia”. As big techs são as culpadas. Desreguladas, obscuras, voltadas ao lucro. Criam paróquias ideológicas, espalham mentiras, destroem o senso comum. O cidadão vira consumidor. O eleitor, marionete.
A solução, portanto, é o controle legal e democrático das plataformas. De preferência, liderado por juízes — ele poderia ter a coragem de escrever “reis-filósofos”.
O texto não é apenas fraco. É confuso, pretensioso e autoritário. Confunde filosofia clássica com pedagogia cívica moderna. Usa Jaeger como panfleto de regulação estatal. E transforma Alexandre de Moraes num humanista togado, defensor da razão contra as trevas digitais. Tudo isso seria apenas risível, se não fosse tão revelador.
Comecemos por Jaeger. Paideia não é um elogio ao Estado tecnocrático moderno e muito menos uma defesa da democracia. É o estudo do ideal de formação do homem grego. Um projeto educacional fundado na tensão entre natureza e lei, entre poesia e filosofia, entre força e medida. Jaeger jamais sugeriu que a formação do cidadão devesse servir à manutenção de instituições democráticas. Muito menos à blindagem de ministros.
E há trechos que dispensam comentário:
“Enquanto tivermos na vanguarda dessa caminhada interminável, porém imprescindível, com cidadãos como Alexandre de Moraes, estaremos bem. Nossa democracia estará bem.”
Isso não é argumento. É culto público.
Platão, como se sabe, não era nada democrata. A democracia, para ele, é o penúltimo estágio antes da tirania. Regime da desordem, da permissividade, da fragmentação da alma. O homem democrático é movido por desejos, não por razão. Confunde liberdade com capricho. Confunde opinião com verdade. É nesse ambiente que o tirano cresce. Obrigado, Alexandre!
Platão não acreditava em “cidadãos bem informados”. Acreditava em reis-filósofos — e desconfiava do povo. O guardião da República não protege a democracia. Protege a justiça contra tiranos. É, aliás, uma figura antidemocrática por excelência. Citar Platão para exaltar instituições democráticas é, no mínimo, sintomático. Vocês realmente acham que Platão veria em Alexandre de Moraes um guardião da Kallipolis?
Mercadante acredita que estamos sendo manipulados por algoritmos. Em parte, até tem razão. A lógica das redes favorece a polarização e a mentira. As pessoas pensam pouco, reagem muito, vivem de estímulos.
Então, ele propõe o remédio: controlar a informação. Submeter plataformas ao Estado. Criminalizar a desinformação. Fiscalizar conteúdo. Criar filtros públicos para o que é verdadeiro. Trata-se, no fundo, de uma proposta de tutela. O cidadão deve ser protegido de si mesmo. A liberdade, supervisionada. A opinião, regulamentada. E ainda tem coragem de chamar isso de... democracia.
Mas chamar de Paideia é abuso. A tragédia do texto está no conteúdo e no estilo. Afetado, pedagógico, pretensamente elevado, ele tenta disfarçar doutrina com erudição filosófica. O problema não é citar Platão, Jaeger ou Hegel. É usá-los como mascotes institucionais.
Eis o momento em que Mercadante decide escrever como sumo sacerdote da democracia ilustrada:
“As verdadeiras democracias, fundadas na Paideia e no esclarecimento...”
A democracia, diz ele, “comporta e exige a diferença de opiniões”. Desde que não sejam erradas, desde que passem pelo crivo do algoritmo moral do STF.
A frase seguinte é reveladora: “não pode conviver com a manipulação autocrática”. Isso não é defesa da democracia. É o aviso elegante para legitimar o déspota esclarecido.
A culminância retórica vem com o espantalho apocalíptico: “o século do neocolonialismo digital”. Expressão eloquente, vazia, mas muito útil. Serve para tudo: para justificar censura, para terceirizar a culpa, para transformar redes sociais em ameaça existencial.
A democracia de Mercadante parece forte o suficiente para resistir a qualquer coisa — exceto à liberdade.
É bem isso. Mercadante fez o que sabe fazer: puxar o saco. Ele não gosta de estudar. Como ministro da Educação, dizia que os professores no Brasil eram formados com excesso de teoria, quando todo mundo sabe que precisam ler cada vez menos para ter um diploma nas mãos. Mercadante não deve ter lido mais do que algumas frases atribuídas a Platão dispersas nas redes sociais...
Qualquer um com um mínimo conhecimento sobre a vida de Platão, sabe que ele não acreditava na democracia. Achava que o poder deveria ser exercido apenas por pessoas esclarecidas e formadas para exercer o poder. Não me surpreende a "santa ignorância" do pseudo intelectual Aloísio Mercadante..