#OCochichoDoDemônio
Há um ano terminava uma das melhores séries já feitas: "Succession".
Há um ano chegamos ao final daquele que é um dos maiores sucessos da televisão, a série Succession, criada por Jesse Armstrong e com produção executiva de, entre outros, Mark Mylod, Will Ferrell e Adam McKay. Eu geralmente torço ao nariz para tudo que está na moda; o hype, afinal, é geralmente uma grande besteira.
Mas não dessa vez.
Eu demorei para entrar na série mas, depois que comecei, não consegui parar. Succession de fato é uma obra magistral, daquelas que nos fazem lembrar o que é a verdadeira arte da televisão dramática e serializada.
Digo isso por que, desde que entramos na tal da Golden Age of Prestige TV, marcada pelo sucesso de séries de The Sopranos, Mad Men, Six Feet Under, Breaking Bad, True Detective, House of Cards, Game of Thrones etc que passaram a dominar a “conversa cultural”, suplantando o papel de livros e cinema, cristalizou-se a ideia, principalmente entre cineastas, de que a TV é o futuro. Não, não é, e cinema e TV são coisas diferentes. Não obstante tenhamos séries como Euphoria, Tokyo Vice, Rings of Power e Too Old to Die Young, que possuem um acabamento estético melhor do que muitos filmes que vemos por aí, a verdade é que elas são exceções, e a arte da TV dramática não é essa. A arte de uma série não é a arte do diretor, mas sim a do showrunner e, depois, a dos roteiristas e do elenco. Estrutura narrativa, divisão de arcos temáticos e de conflitos ao longo de uma temporada, que se articulam em episódios, cenas, beats dramáticos. Seu sucesso estético se dá pelo talento dos atores, da fina carpintaria do roteiro e, no plano da direção, algo fortemente inspirado em Howard Hawks: duelos violentos que se dão nos planos dos diálogos, da mise-en-scéne extremamente sofisticada e, mais do que tudo, uma montagem que costura isso perfeitamente. Uma das marcas de Hawks era justamente a sua habilidade de montar cenas de diálogos com três ou mais personagens, com todos falando um sobre os outros. Poucos conseguem fazer isso, e é mérito que os diretores de Succession, liderados por Mark Mylod, tenham conseguido fazer isso. Dito isso, não vou entrar nestes méritos sobre a arte da TV dramática serializada. Quero comentar um pouco sobre a série, tendo em vista que ela chegou recentemente ao seu final.
Succession é nada menos que um dos maiores sucessos culturais recentes. A série abocanhou os principais prêmios, com membros do elenco - Brian Cox, Jeremy Strong, etc - vencendo repetidamente estatuetas pelo seu trabalho extraordinário. A série em si - mais uma no estelar catálogo da HBO - é sucesso de audiência, e é justo dizer que poucas conseguiram mobilizar o debate cultural como ela.
Além disso, Succession parece entrar no zeitgeist de obras que abordam a vida dos super-ricos: os filmes The Glass Onion: A Knives Out Mystery (idem, 2022, de Rian Johnson), O Menu (The Menu, 2022, de Mark Mylod, de Succession), Infinity Pool (idem, 2023, de Brandon Cronenberg), Triângulo da Tristeza (Triangle of Sadness, 2022, de Ruben Östlund) e, claro, séries como The White Lotus são alguns dos exemplos mais notáveis (e notórios). Com seu estilo documental, um falso cinema veritè (lembra um pouco o seriado The Office), Succession também entra nessa mesma categoria, de desnudar e satirizar os hábitos e estilo de vida excêntrico e dispendioso dos ricaços.