#OJardimDosFinzi-Contini(2)
A trama, os personagens e a estrutura do livro de Giorgio Bassani – além de uma análise das adaptações da obra feitas para o cinema
Parte 2
O jardim dos Finzi-Contini, romance mais conhecido de Giorgio Bassani, começa em 1957, com um prólogo do narrador sobre o que aconteceu com os judeus de Ferrara. Seguem-se 4 partes onde descreve sua infância, adolescência e maturidade até sua fuga da cidade, sempre observando de perto a família Finzi-Contini, especialmente sua paixão, Micòl, a caçula, que ora se aproxima, ora se distancia do narrador. A maior parte do livro se passa entre 1938 e 1943, a partir das "leis raciais". No epílogo, Giorgio relata o triste destino de cada um, possivelmente já escrito nas estrelas 500 anos antes.
Em 1492 a família chegou à Itália em fuga da Espanha junto com outros 9000 judeus, após a expulsão por Fernando e Isabella de Aragón. Esses refugiados eram a elite intelectual, sofisticada, da Espanha, mas agora aportavam completamente destituídos. Eram judeus sefaradi ("espanhóis"). Encontraram comunidades judaicas italianas que lá viviam desde o século 2 AEC com quem tinham diferenças culturais marcantes, a começar dos idiomas. Para os recém-chegados a situação inicialmente foi de um certo alívio, mas pouco tempo depois também na Itália começaria a perseguição sistemática que iria durar cerca de 300 anos. Em algumas cidades, como Livorno e Ferrara, os judeus recebiam proteção das autoridades, e mesmo obrigados a viver em guetos, ao menos não sofriam ataques da população. Eram as exceções.
Por influência de Napoleão e sua ideia de igualdade, a vida dos judeus na Itália começou a melhorar (os direitos para todos que este homem estabeleceu em menos de 15 anos mudou mais a Europa do que outros que reinaram por décadas - pena que é tão fácil reverter o bem). No século 19, Moïse Finzi-Contini foi o patriarca da primeira geração a poder sair do gueto e receber alguns direitos, como o de possuir terras. Adquiriu um vasto terreno em Ferrara, onde construiu um parque - um jardim belíssimo - e cercou-o com muros. Motivado por prevenção, certamente, mas foi interpretado como arrogância. A cidade de Ferrara é geograficamente próxima a Bologna, mas de alma mais parecida a Verona ou Veneza, com a tragédia shakesperiana impregnada em cada pedra de cada casa, modesta ou palazzo, em suas brisas que sussurram memórias.
Avançamos para o século 20. Os Finzi-Contini, tremendamente cultos e agora uma das famílias mais abastadas entre os judeus da cidade, vivem nessa propriedade, segregados por si próprios e pelos outros. Os filhos não frequentam a escola exceto para os exames finais; estudam em casa com tutores; têm motorista à disposição; a família dispõe de uma vasta biblioteca particular. Para quem os vê de fora parecem indiferentes a tudo que se passa em redor, segundo Giorgio, o narrador. Ledo engano, como ficaria demonstrado no momento mais trágico.