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Os partidos políticos se tornaram exatamente aquilo que Simone Weil os definia: máquinas de paixões coletivas
Simone Weil, na década de 40, escreveu suas notas Pela supressão geral dos partidos políticos. Para ela, os partidos são apenas máquinas de paixões coletivas pelas quais as pessoas penhoram suas individualidades em nome de um grupo, de uma causa, de uma ideologia. Assim, embarcando no discurso ideológico partidário, o indivíduo abre mão de suas convicções e crenças, de sua razão e de seus próprios pensamentos para sustentar uma visão monolítica de mundo. Ainda pior: oprimido por um sentimento de solidariedade, pode até se tornar incapaz de censurar atos desonestos.
A tendência essencial dos grupos ideológicos que buscam suprimir o individual no coletivo é sempre totalitária. E quando esse totalitarismo se expressa de formas e grupos diferentes, os conflitos são inevitáveis e, com o tempo, vão se tornando cada vez mais violentos e irracionais.
Weil lembra que a toda realidade implica um limite, mas como a finalidade de um partido político é sempre muito vaga, a tendência é radicalizar as suas bandeiras ou torná-las o mais abrangente possível, a fim de ampliar sua influência, seu poder e seu público. Então, surgem os conflitos, os ânimos se exaltam e as disputas contra os inimigos tornam-se cada vez mais violentas:
“Se uma só paixão coletiva arrebata todo um país, o país inteiro é unânime no crime. Se partilham duas, quatro, cinco ou dez paixões coletivas, dividem-se em vários bandos de criminosos. As paixões divergentes não se neutralizam, como no caso de uma poeira de paixões individuais absorvidas numa massa; existem em pequeno número, mas a força de cada uma é muito grande para que possam ser neutralizadas. A luta as exaspera. Chocam-se num barulho realmente infernal que torna impossível ouvir, um segundo que seja, a voz da justiça e da verdade, que passa quase sempre imperceptível”.
Em suma, é a banalidade do mal de que falava Hannah Arendt, quando homens normais passaram a cumprir ordens absurdas, e que Zigmunt Bauman retomou para estabelecer o ápice da insensatez da modernidade líquida. O ceticismo radical pós-moderno cria um ambiente não apenas de desconfiança mútua, mas de banalização e relativização dos valores morais e das relações pessoais. Num mundo em que os valores mudam constantemente, nada parece ter sentido, nada é sólido porque tudo flui de forma líquida, para usar a terminologia de Bauman. Assim, sem valores e onde a inimizade impera, a política se torna estéril porque não produz nada além de desavenças.
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Pela supressão dos partidos políticos
Simone Weil
Editora Âyiné, 2021
92 páginas