A arte de narrar aproxima-se de seu fim porque a sabedoria – o lado épico da verdade – está em extinção
Walter Benjamin, “O Narrador – considerações sobre a obra de Nikolai Leskov”
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A primeira vez que ouvi falar de Gustavo Capanema, na primeira década dos anos 2000, a informação à qual tive acesso já chegou com embalagem. “Político mineiro. Ministro da Educação e Saúde Pública do Governo Vargas entre 1934 e 1945. Amigo de intelectuais como Villa Lobos, Cândido Portinari e Carlos Drummond de Andrade. Senador da República. Morto em 1985 aos 84 anos”. Na era do Big Data, aparentemente já compreendemos um assunto ou entendemos uma personalidade na medida em que temos acesso ao máximo possível de dados numa pesquisa no Google. Além do verbete da Wikipédia e das matérias de alguns jornais, a ferramenta oferece, ainda, uma série de ilustrações – fotos, vídeos e até mesmo verbetes nas enciclopédias digitais.
Ocorre que nada poderia ser mais danoso para efeito de uma pesquisa biográfica. É evidente que precisamos saber do que se trata o assunto acerca do qual se fará a pesquisa. Mas o que os dados acumulados na internet fazem pertence a outra natureza. O dano é doloso, sem intenção de matar, portanto. Em outras palavras, o modo como as informações são apresentadas mata a curiosidade exatamente porque aniquila o mistério. As informações apresentadas remontam ao espírito de certo jornalismo que recupera a lógica dos boletins de ocorrência: contam o que aconteceu, explicam os motivos, destacam os personagens coadjuvantes, apontam a causa da morte e dizem que foi ao enterro.
E o leitor sai dessa breve imersão com a sensação de que já sabe o que aconteceu. Sem mistérios.
Mas uma biografia não se apresenta sem uma dose de mistério.