#[trabalharcansa]: Um espaço claro e aberto, pt. 01
Sobre a arte de João Gilberto e Brancusi
Um espaço claro e aberto, pt.01
Alexandre Sartório
“Quando eu canto, penso num espaço claro e aberto onde vou colocar meus sons. É como se eu estivesse escrevendo num pedaço de papel em branco: se existem outros sons à minha volta, essas vibrações interferem e prejudicam o desenho limpo da música.” (João Gilberto, em entrevista concedida a Tárik de Souza, para a Veja, em 1971)
“…o que é real não é a forma exterior mas a essência das coisas.” (Brancusi)
“…a música é o silêncio entre as notas.” (frase atribuída a Debussy e a muitos outros)
“Ah, um recanto tem, miúdos remansos, aonde o demônio não consegue espaço de entrar, então, em meus grandes palácios.” (Riobaldo, Grande Sertão: Veredas)
Constantin Brancusi é, ao lado de Picasso, o mais influente escultor do século XX, diz Carolyn Lanchner (curadora do Moma por três décadas), resumindo uma opinião dominante atualmente. Ele nasceu na Romênia, cuja cultura tradicional ficou sempre entranhada na sua imaginação, influenciando seu trabalho, mudou-se para Paris em 1904, à procura um espaço claro e aberto, e lá viveu até o fim de seus dias, em 1957. Por pouco tempo foi aluno de Rodin, de cuja sombra agigantada se afastou em 1907, à procura de um campo mais livre para cultivar seu universo estético. Brancusi reviveu a importância da técnica de esculpir diretamente a pedra, que vinha se enfraquecendo desde fins do século XIX; suas esculturas elegantes, de formas sintéticas, se aproximavam de formas ideais ou abstratas, com exceção de sua obra mais famosa, que é puramente abstrata, a Colonne sans fin (primeira versão de 1918), uma coluna feita de uma forma geométrica esculpida na pedra replicada quantas vezes quisesse o artista, e que, na teoria, podia ligar a terra aos mais altos céus; a Colonne é uma das pedras angulares da escultura moderna.