Pensar que estamos em 2024 e caminhamos celeremente para mais de vinte e um anos de governos que não apenas afundam o país economicamente, ainda mais trágico, sufoca qualquer forma de vida cultural/espiritual nestas terras. Pensar que, neste período, vimos ainda o naufrágio de toda uma geração consumida pelo desejo de poder político (que promete acima de tudo dinheiro fácil) é ainda mais lamentável. Geração que, ao invés de obras-primas da literatura e da arte, terminou por ministrar nos cursos que nada mais oferecem que o mais patético “coachismo”, ao invés de autores, poetas e artistas, temos influenciadores a dar lições de vida e salvar a civilização ocidental em toda e qualquer rede social que seja novidade.
Nestes dias confesso que até mesmo o Substack me dá certa canseira, visto que se, no início, havia por cá pessoas que escreviam por amor aos temas tratados, vemos cada vez mais aparecer a mesma turminha de sempre, com seus dedos em riste e sua arrogância moral - uma vasta conjunção de idiotas, estas figuras tão avessas ao espírito.
Pois, ao dar um tempo desta plataforma, nada melhor que ler, e eis que justamente nestes dias me caiu nas mãos o livro de ensaios de Eric Voegelin, autor que, como Chesterton ou Girard, foi severamente conspurcado pela ralé que assola nosso pequeno mundo cultural. Basta abrir qualquer página estes Ensaios publicados 1966/1985 - publicado pela É Realizações e disponível no site da [trabalhar cansa], para ter a confirmação deste facto.
Vejam, por exemplo, o primeiro ensaio do livro, “A universidade alemã e a ordem da sociedade alemã”, onde o autor reflete sobre o papel das instituições universitárias e dos intelectuais alemães na ascensão do nazismo na Alemanha dos anos 30. Voegelin mostra como uma sociedade dominada pelo estranhamento ao espírito, pode se fechar e se revoltar contra o fundamento divino da sua existência. Ele esclarece que este “espírito carrega o sentido clássico de nous, aquilo que todos os homens têm em comum, assim, através da vida do espírito, que é comum a todos, a existência do homem se torna a existência da comunidade, é na abertura do espírito comum que se desenvolve a vida pública da sociedade”. Ora, mas há aqueles que se fecham ao que é comum, ou se revoltam contra isso, ou ainda que remove a si mesmo da vida pública e da comunidade humana. É o homem privado, ou, na linguagem de Heráclito, um idiotes.
Pois bem, uma sociedade onde a figura dos idiotes passa a ser dominante – estes homens estranhados ao espírito – está fadada a se desintegrar, a ruir sob o peso de seus radicalismos privados. O Brasil, hoje, é fruto de duas décadas de predominância dos idiotes no debate público e cultural do país.