A jornalista, pesquisadora das relações étnico-raciais e doutoranda em Comunicação e Cultura na UFRJ, Etiene Martins, escreveu o texto mais racista que li em um veículo de comunicação. Seu artigo “Por que 22 anos de ditadura incomodam mais que 388 anos de escravidão?, foi publicado no jornal Estado de Minas.
A estratégia é odiosa. Etiene Martins transforma o rosto da pessoa humana em arma de condenação. Ela não escreve, ordena:
“Antes de ler esse artigo eu peço que, por gentileza, volte na foto e repare bem o rosto...”.
Este é o rosto.
Essa imposição não é mero convite à observação de alguém, mas de “algo” demonizado. É o comando que direciona o olhar para categorizar, classificar e aniquilar, de forma imediata, marcas fenotípicas em culpa histórica. Ao fazer isso, Martins converte o rosto de Walter Salles Jr. em um relicário de opressão. Lá, naquela foto, já não há mais uma pessoa; é o bode-expiatório: o homem que carrega o peso de um legado que ele nunca escolheu é invocado para representá-lo no altar do ressentimento.
Etiene Martins afirma que, ao olhar para o rosto daquele homem, ela enxerga “a descendência dos que torturaram, estupraram, açoitaram, mantiveram em cárcere os meus ascendentes”.
No fatalismo fingido, ela apega-se à ideia de que a dignidade do indivíduo está irremediavelmente vinculada à herança histórica racial. Dessa forma, não há mais singularidade, o valor irredutível de alguém; o rosto torna-se receptáculo de um legado trágico. Transmite toda culpa do mundo. Etiene deifica essa herança e a converte em determinismo racial.ra
Pra contrastar, lembrei-me do filósofo francês Jean‑Luc Marion. Ele traz a melhor reflexão sobre “o rosto” no âmbito da ética da alteridade. Marion é um filósofo católico de tradição fenomenológica. Ele afirma que
“o rosto se torna verdadeiramente o fenômeno de um homem quando faz surgir uma pessoa, essencialmente definida como eixo e a origem de suas relações. Por isso, é preciso sustentar que o fenômeno natural do rosto do outro não se pode descobrir senão à luz da caridade. Sem a revelação da transcendência do amor, o fenômeno do rosto, portanto [o reconhecimento da presença do outro], não pode simplesmente se ver”.
Para Marion, portanto, o encontro com o rosto do outro é um ato supremo que se consuma na caridade (no sentido cristão da imago dei). O reconhecimento da diferença absoluta do outro só pode ser mediado nesse ato, que é o contrário da vingança evocada por Etiene Martins. Porque, para Etiene Martins, o espaço da diferença absoluta do rosto do outro é preenchido com vitimismo, ressentimento e um intento de aniquilar a dignidade. Ao transformar a alteridade num campo de batalha racial, ela predefine o destino do outro, demoniza-o voluntariamente: homem branco, rico e herdeiro da opressão. Culpado.
É importante destacar que, do ponto de vista jurídico, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já declarou que o racismo contra brancos não existe. A decisão ecoou. Etiene Martins adota o discurso que perpetua a estigmatização racial com a consciência tranquila. A vingança está amparada. Ela se vale do conceito de racismo inverso — que, segundo o STJ, é inexistente — para aniquilar racialmente o rosto do suposto inimigo.
Atualização
Curiosamente, a mesma Etiene Martins que demoniza Walter Salles Jr. por seu “pecado de brancura” posa radiante ao lado de um homem branco. De repente, a cor da pele deixa de carregar a maldição ancestral. O que era sinal de opressão vira passaporte para elogios, desde que a pessoa comungue do mesmo credo ideológico. A brancura de Lula brilha como uma estrela. É o racismo seletivo: se você está do meu lado, ganha imunidade histórica; se não, torna-se alvo da cruzada de ódio e ressentimento.
Eu li o artigo dela e fico pensando como deve ser triste viver uma vida de rancor. Curioso ver a relação que ela faz justamente no campo da arte onde onde o talento de muitos transpôs as barreiras do racismo e abriu espaço para o amor e admiração.
Certa vez pensando sobre o racismo me peguei fazendo a mesma associação. Porém, desta vez foi ao contrário dela. Todos as pessoas que mais gosto no campo do cinema, na música e também no esporte são negros: Miles Davis, John Coltrane, Jimmy Hendrix, Bob Marley, Michael Jackson, Stevie Wonder, Ray Charles, Tina Turner, Etta James, Aretha Franklin, Snoop Dog, Dr. Dre, Milton Nascimento, Gilberto Gil, Mussum, Jorge Ben, Paulo Moura, Arlindo Cruz, Martinho da Vila, Denzel Washington, Viola Davis, Morgan Freeman, Pelé, Michael Jordan, Usain Bolt, Anderson Silva…
Eu poderia ficar aqui escrevendo essa lista sem parar.
Eu tenho amor e admiração por todas essas pessoas. Todas elas me trouxeram tantas alegrias, tanto conforto, que eu não consigo imaginar como seria a minha vida se não os tivesse conhecido.
Eu tenho dificuldades em entender a cabeça de um racista. Eu sei que não tenho como entender e sentir o que ela sente por ser branco. Mas nunca vou carregar e deixar que meus filhos carreguem culpa por ser o que são.
Ódio contra branco , hétero , cristão , classe média / rico tá liberado no governo do amor.