– poemas de Raíssa Correia
(Primeira explicação do chamado)
Porque estás sozinho
porque és a urgência das aves migradoras
porque não mudas
e te impões na rotina dos amantes
mas a tua voz é plena e pulsante como
um ruído familiar
atravessando a porta ao candelabro
Porque estás à véspera das perguntas difíceis
já não me espanta a tua silhueta
na figura dos homens
No entanto, quem és tu que abate a beleza,
para recuperá-la na face de outrem?
e tudo constrange para não respondermos
para retermos a palavra indizível
Porque és terno quando te escuto e terrível
na mesma medida
quando lanças o teu vazio sobre o mundo
porque talvez só as crianças saibam colher
a tua vinda
à espreita, com as janelas abertas
e o coração na boca
Como responderíamos, noite adentro,
um louvor que já não fosse a natureza
exposta?
Porque tocas o destino das rosas
para que possam sentir, enfim, os vivos
e alongar em nós mesmos o seu idioma
Porque estás escrito sobre os lábios
dos mortos
Eles sim, desaparecem, cheios do teu sangue
e toca-nos com a tua eternidade
confundindo nossa substância entre eles,
onde tudo é despedida
onde nada mais se modera
Porque és o primeiro sob o rascunho
da saudade
porque é ousado dizer-te que te amo
e assim mesmo suporto não ser mais a que fui
antes de ti
Porque já não fujo
porque és fecundo
e me chamas pelo nome.