Para a “Folha”, a repórter Mayara Paixão entrevista o ex-presidente uruguaio Pepe Mujica, que há algumas semanas anunciou câncer no esôfago. O gancho para a entrevista, no entanto, vai além da descoberta do Imperador dos Males.
A escolha do editor não deixa dúvidas de que o leitor do jornal está à frente de um sábio:
Temos muito mais riqueza, mas somos seres piores, diz Pepe Mujica à Folha
Poucos dias após anunciar descoberta de tumor no esôfago, ex-presidente do Uruguai e referência da esquerda fala sobre como entende a vida e a morte e analisa a América Latina
Nos primeiros parágrafos do texto, antes da entrevista propriamente dita, há todo um esforço para a construção de um clima intimista. Aquilo que os jovens gauche na vida e desconstruídos chamam de “casa de vó”:
Nas paredes repletas de pequenos objetos da simples cozinha de teto baixo, várias conservas de tomate e fotos de Manuela, cadela que o acompanhou por mais de 20 anos antes de morrer, em 2018.
Na minúscula sala adjacente, ao lado da varanda com caixotes cheios de espigas de milho, há uma porção de livros amontoados. "Venha, isso aqui você nunca mais terá a chance de ver", diz ele, retirando de uma maleta uma réplica do diário de Che Guevara com suas últimas anotações em letra miúda numa agenda de um vermelho desbotado.
No varal ao lado de fora, as roupas seguiam expostas à garoa.
Os parágrafos acima contemplam a tríade do jornalismo afetado de hoje em dia. A estrutura da casa simples (cozinha de teto baixo); hábitos simples (conservas de tomate); e as anotações em letra miúda (numa agenda de um vermelho desbotado).