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Avatar de Carlos Matta

João Pereira Coutinho na Folha de São Paulo em 15/04/24:

Podemos não estar interessados no Apocalipse, mas ele está interessado em nós

Só o humor nos salva. A TV está ligada, o ataque do Irã a Israel vai rolando na tela. E eu rio com uma entrevista de John Jenkins, antigo diplomata britânico no Oriente Médio, à revista "New Statesman".

Diz ele, com inteira razão, que o mundo ocidental perdeu a capacidade de entender o universo simbólico e religioso da elite teocrática iraniana. E, como

exemplo, contou uma conversa que teve, anos atrás, com um conselheiro iraquiano em Bagdá.

Alguém contara a Jenkins que o então presidente iraniano Mahmoud

Ahmadinejad deixava sempre uma cadeira vazia nas suas reuniões de governo.

Para quem? Para o 12° imã do xiismo, que desapareceu no século 9o

○ conselheiro iraquiano, confrontado com o bom humor de Jenkins, perguntou-lhe se ele não acreditava no regresso do "imä

oculto". Jenkins respondeu que, como católico, também aceitava o fim dos tempos. Mas duvidava que o "imă oculto" (o Mahdi) fizesse a sua aparição numa reunião de governo

Que tem essa história a ver com o ataque em curso?

Tudo, embora eu entenda a perplexidade da pergunta. Nos textos correntes sobre o

conflito israelense-palestino, cometem-se dois erros que só atrapalham

○ primeiro é acreditar que ainda existe um conflito israelense-palestino. Não existe. 0

conflito é israelense-iraniano há, pelo menos, duas décadas.

○ segundo equívoco decorre do primeiro: ○ regime teocrático, usando "proxies" (Hamas, Hezbollah etc.) ou inaugurando

hostilidades diretas, combate Israel para destruí-lo, não para garantir a solução dos "dois Estados". Mas por que motivo Teerä quer destruir Israel?

Sim, haverá razões geoestratégicas (e bem pragmáticas) que lidam com a ambição do Irå em ser a grande potência regional no Oriente Médio

Mas parte da resposta está também na cadeira vazia que Ahmadinejad gostava de ter nas suas reuniðes. Na reinterpretação

que os aiatolás Ruhollah Khomeini e Ali Khamenei fizeram da tradição messiânica do xiismo desde 1979, é preciso preparar o regresso do Mahdi.

E, para isso, é imperioso remover os

"obstáculos" que existem no seu caminho. Israel é o maior deles.

Essa história, que não casa bem com nosso secularismo iluminado, está bem contada no ensaio que Saeid Golkar e Kasra Aarabi publicaram no Middle East

Institute em 2022: "Iran's Revolutionary Guard and the Rising Cult of Mahdism: Missiles and Militias for the Apocalypse"

Aconselho vivamente.

Explicam os autores que,

tradicionalmente, o retorno do "imă

oculto", juntamente com seus 313

soldados para vencer o mal numa batalha apocalítica, implicava uma preparação religiosa e espiritual para os seus seguidores.

Com a revolução iraniana de 1979, o

aiatolá Khomeini introduz uma cisão

nesse "quietismo xiita". A preparação é também política, desde logo pela instauração de um governo islâmico e de uma guarda revolucionária capaz de velar

pelos valores da revolução

Mas é sobretudo com Ali Khamenei,

sucessor de Khomeini como "líder

supremo", que o "mahdismo" se converte na lente principal do regime para entender o país e o mundo.

Contam Golkar e Aarabi que, em 1997, com a vitória do "reformista" Mohammad Khatami nas eleições presidenciais, Khamenei fica alarmado com o fato de 73% dos membros da Guarda Revolucionária Iraniana terem votado no

"reformismo".

O que veio a seguir foi terapia de choque na formação das novas gerações de guardas revolucionários. A defesa da

teocracia e a necessidade de exportar a revolução islâmica no Oriente Médio continuaram sendo os pilares essenciais do regime.

Mas a dimensão escatológica do

mahdismo passou a orientar as opções geoestratégicas do Irã na luta contra "o sionismo, 0 sionismo wahabista e o sionismo cristão"

Ou, traduzindo em linguagem menos cifrada, contra Israel, os sunitas e os Estados Unidos. Não haverá redenção da humanidade com esses demônios no caminho.

Na entrevista, John Jenkins termina com uma paráfrase trotskista: o fato de não estarmos interessados no Oriente Médio não significa que o Oriente Médio não está

interessado em nós.

É uma boa frase, embora eu prefira outra: o fato de não estarmos interessados no apocalipse não significa que o apocalipse não está interessado em nós.

Enquanto o mundo não digerir essa

verdade inconveniente, qualquer análise sobre a guerra naquelas bandas estará incompleta.

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Avatar de Carlos Matta

Mario Sabino no Twitter em 14/04/24:

Com o ataque direto a Israel, desfaz-se a farsa do estado terrorista do Irã, patrocinador dos facínoras do Hamas, do Hezbollah e Houthis, na sua covarde guerra por procuração.

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Avatar de Cristina5777

Parece mesmo a antessala do apocalipse, e não vai precisar de um Armagedom, a raça humana vai se aniquilar sozinha.

Obrigada pelo texto magnífico.

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Avatar de Carlos Araujo

Me perdoe estagiário, não tenho palavras para comentar seu excelente texto!

Que Deus nos perdoe!

Quem viver verá!

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Avatar de Marcia Muliterno Basso

Inveja branca, ou melhor, admiração pelo texto maravilhoso! Estagiário você foi promovido novamente.

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Avatar de Carlos Araujo

Com certeza Márcia, foi promovido.

" Inveja branca ", você pode tudo Márcia!

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Avatar de eugenio mohallem

O certo é “interveio”. Mas, para um estagiário, o texto até que está bom.

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Avatar de Anita de Moraes Slade

Eu ia fazer a mesma observação.

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Avatar de Paulo Cesar

E ainda tem "a Austrália também [?] igrejas ortodoxas." É preciso atenção ao texto, senão a credibilidade...

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Avatar de Vivian Schlesinger

MVC e JPC juntos em um post só poderia dar nisso. Excelente. Nota 1000.

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Avatar de Eduardo Sternick

Lendo o brilhante texto me remeti na hora a outro exemplo: a Jihad do STF contra Moro. O juiz foi tratado como bandido. So faltaram emitir uma fathua contra ele (na verdade emitiram so nao nos contaram). Se o STF agisse como deveria agir um STF, seria uma enorme contribuiçao contra o caos que vivemos

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Avatar de Maria jose Silveira da silva

Obrigada menino querido! Um bom texto para mim é uma forma de oração. Leio atenta, com o coração e agradeço por ele. Oro em silêncio, guerreando com a minha jhad particular, compreendendo que podemos pouco em relação a potências como o Estado, o direito, a opinião pública, as religiões etc que nos atravessam sem dó e piedade, mais podemos manter com elas conversações e continuar a nossa guerrilha interna, tentando, dentro do possível, manter a serenidade neste pandemônio em que o mundo tem se transformado. Bjuuuu

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Avatar de Paula

Esses "jihardistas" e seus cupinchas são um bando de frustrados, invejosos, noiados na religião, que querem jogar o mundo na latrina deles.

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Avatar de Fábio Nakamura

Sabe o que me dá medo... pior que a maioria dos muçulmanos, pensam assim. Em alguma momento, será necessário domesticá-los.

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Avatar de Paula

Esses "jihardistas" e seus cupinchas são um bando de frustrados, invejosos, noiados na religião, que querem jogar o mundo na latrina deles.

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Avatar de Victor lag

E não esqueçamos , drogados .

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Avatar de Angélica Silva

Obrigada, querido "estagiário".

Teve mais dois atentados na Austrália em 1 única semana. Um dos outros dois foi sobre religião também. Portanto, se eu estiver correta, esse, do bispo, é o quarto em 1 semana.

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Avatar de Heitor

Aqui no Brasil, os caras que atacaram escolas não era de Jihad nenhuma, nem de direita, nem nada, eram amalucados com sede de sangue, confessadamente. O moleque da Austrália todos conheciam, o menino maluquinho, doente a beça, conforme disse um parente ou conhecido dele, em entrevista coletiva, na rua. Os manicômios costumavam conter essas pessoas, com medicamento, no entanto, as políticas acharam isso caro. Agora pagam outro preço. Não adianta culpar Jihad coisa nenhuma. Tem louco para todos os lados. Cada um que se cuide, infelizmente, não se pode passear na floresta achando que o lobo não vem.

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Avatar de vinicius grisi

O mundo sempre foi um pandemônio. Desde sempre. Basta passar os olhos em sua história. A grande (literalmente) questão é que somos uma espécie predadora que saiu absolutamente do controle e está consumindo o planeta. Continua a se multiplicar irrefreadamente. E, para completar, ainda ousa se dizer criada à imagem e semelhança de Deus. Este o criador. O outro o destruidor. Mas, tudo ainda pode se mostrar pior: quer fazer crer que Deus reenviará alguém, no caso um humano, para lhe salvar a existência. Fácil assim. Somos a fonte de destruição da criação divina, da qual apenas fazemos parte. E queremos fazer crer que o Criador nos salvará porque somos mais importantes que o resto da criação. É realmente espantoso o que a mente humana é capaz de criar. Se pensarmos que o que está por aí escrito é verdadeiramente a palavra de Deus, bateremos de frente com um erro crasso de comando: "Crescei e multiplicar-vos. Enchei e dominai a terra." Se assim entendermos, melhor reformatar e rever as configurações iniciais. Chocante!

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Avatar de Tereza Sayeg

Excelente texto. Só uma observação: o passado de intervir é interveio.

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Avatar de Germano Paulo Bunn

Corrigindo o português: não é INTERVIU... é INTERVEIO

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Avatar de Míriam

Você disse tudo: estamos abandonados. Aqui como lá.

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Avatar de Míriam

Você disse tudo: estamos abandonados. Aqui como lá.

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