Na mesma semana em que Toffoli anulou todos os atos contra Marcelo Odebrecht, Lula anunciou que quer exportar etanol brasileiro de segunda geração para o mundo, e a Petrobras revogou a venda de 5 refinarias que seriam privatizadas. De uma hora para outra, o brasileiro se sentiu teletransportado para alguma época por volta de 2007, quando a Odebrecht era uma "campeã nacional" que construía pelo país (e pelo mundo) afora, quando Lula levantava a bandeira do álcool como uma commodity made in Brazil para os gringos e quando a Petrobrás, embalada pelo anúncio do pré-sal, prometia ser a empresa pivô do desenvolvimento nacional por meio de investimentos bilionários. Não importa que o resultado dos anúncios dessa semana acabe sendo o mesmo do passado: corrupção, desperdício e poucos enriquecendo às custas de muitos. O que importa é o diagnóstico: somos uma sociedade que sofre eternamente de déjà-vu.
Quando o Brasil ficou independente de Portugal, o melhor que a nossa elite política conseguiu conceber foi manter o herdeiro da Coroa Portuguesa como o fiador do novo país. Mais tarde, tivemos a ideia de escapar da crise monárquica colocando os militares no poder: era o início da República da Espada. Alguns anos depois, tivemos a mesma ideia para escapar da crise janguista: era o início da Ditadura Militar. Três décadas após a redemocratização, colocamos no poder um ex-capitão do exército com seu time de ministros generais, dessa vez (a terceira) os militares retornaram para acabar com a crise petista.
É isso que fazemos de melhor como nação: retornar ao passado. Fizemos isso com a bandeira nacional quando da Proclamação da República, utilizando as cores dos Braganças (Verde) e dos Habsburgo (Amarelo) enquanto inventávamos uma história sobre o verde das matas e o amarelo do ouro. Foi isso que fizemos também com o Brasão da República, mantendo os ramos de café e de tabaco (os dois notórios commodities do Brasil Império) até hoje.
Em 1956, decidimos construir, gastando uma fortuna, uma capital no planalto central porque assim dizia a Constituição Federal de 1891, cuja lei era inspirada numa proposta de José Bonifácio feita na Assembléia Constituinte de 1823 (que foi dissolvida por Dom Pedro I), que por sua vez era baseada nos planos dos conselheiros de Dom João VI quando esse fugiu de Napoleão para o Brasil em 1808. A arquitetura dessa capital, inclusive, foi feita com uma visão futurista dos anos 1950, hoje completamente ultrapassada, com rodovias isolando os moradores em pequenas ilhas. Até no nome, Brasília (com o seu sufixo “ia" após a raiz Brasil) remete ao futuro do pretérito.
Assim como os adivinhos no Inferno de Dante, que tinham suas cabeças viradas para as costas, o Brasil não desiste do olhar para trás. Da mesma maneira, Lula não desiste do etanol, assim como a Petrobras não desiste das refinarias superfaturadas, tal como o STF não desiste da impunidade.
Não, não somos um país atrasado, pois o atrasado sai de um lugar e chega a outro, ainda que apenas depois de todos já terem chegado lá. O Brasil é algo muito pior: somos um país atávico. Para onde quer que olhemos, o futuro do país encontra-se sempre no passado.
“Há países de primeiro mundo.
Outros, de terceiro mundo.
O Brasil é de outro mundo.”
(NelsonCavalheira)
Perfeito, texto sensacional! Somos o país parecido com algumas estações de trem, q saem do nada e vão a lugar nenhum. Como país, nunca chegamos a nada, e o povo a bordo do trem prefere descer no meio do caminho, mas depois reclama.