Rousseau, o selvagem e o terrorista
Essa lente filosófica permite que o Hamas não seja visto como extremista, mas como um heroico "combatente da resistência"
Por Prof. Sonia Bloomfield*
A representação midiática ocidental do conflito Israel-Palestina, especialmente no que se refere ao Hamas, não é apenas moldada por correntes filosóficas, mas também está profundamente enraizada no antissemitismo. Enquanto estruturas ideológicas como o conceito do "bom selvagem" de Jean-Jacques Rousseau influenciam a maneira como as elites ocidentais interpretam a violência e a moralidade, esses vieses fazem parte de um padrão histórico maior que trata as vidas judaicas como descartáveis.
O Antissemitismo como Questão Central
A representação distorcida do Hamas na mídia não é apenas um reflexo de teorias intelectuais equivocadas, mas sim a continuidade de uma tradição antissemita de longa data. O duplo padrão aplicado a Israel, que exige um nível impossível de perfeição ética enquanto as atrocidades de seus inimigos são relativizadas, espelha justificativas históricas para a perseguição dos judeus. As elites europeias e suas influências não apenas interpretam erroneamente o Hamas, mas também desumanizam os judeus ao sugerir implicitamente que a violência contra eles é natural, esperada ou até justificável.
Rousseau e o "Bom Selvagem"
Rousseau argumentava que os seres humanos em seu estado natural eram essencialmente bons e apenas corrompidos pela civilização. Essa ideia se tornou a base para o pensamento pós-colonial, que, por sua vez, fomentou a perigosa crença de que a violência cometida por grupos não ocidentais seria uma resposta inevitável à opressão, e não o resultado de escolhas deliberadas. Essa lente filosófica permite que o Hamas não seja visto como extremistas ideológicos que deliberadamente atacam civis, mas como "combatentes da resistência" que apenas reagem a supostas injustiças históricas.
Contudo, essa suposição ignora uma verdade fundamental: os membros do Hamas, como todos os seres humanos, são capazes de fazer escolhas morais. Eles sabem distinguir entre o bem e o mal, entre atos de assassinato e crueldade e atos de compaixão e contenção. No entanto, elites europeias e globais, presas em seu paternalismo rousseauniano, se recusam a reconhecer isso. Elas não veem os combatentes do Hamas como agentes morais plenos, mas sim como "quase humanos", incapazes de tomar decisões éticas e, portanto, indignos de julgamento moral. Essa visão não é apenas absurda, mas profundamente racista. Ela nega aos povos não ocidentais sua humanidade plena ao sugerir que são movidos apenas por circunstâncias externas, e não por escolhas conscientes.
A Humanidade Seletiva das Elites Europeias
O legado intelectual do pensamento de Rousseau é particularmente evidente entre as elites acadêmicas e midiáticas europeias e suas influências. Essas elites criaram um arcabouço moral no qual Israel, como uma democracia ocidental, é julgado pelos mais altos padrões éticos, enquanto o Hamas, por ser um grupo "não ocidental", é isento de responsabilidades morais básicas. No entanto, essa visão não é apenas idealismo ingênuo — é um ponto de vista profundamente racista e antissemita que retrata o Hamas e outros grupos "primitivos" como desprovidos de plena agência moral.
Em vez de responsabilizar o Hamas por seu direcionamento sistemático contra civis, a mídia infantiliza seus membros, tratando-os como se fossem incapazes de tomar decisões morais independentes. Essa visão condescendente isenta os palestinos de sua responsabilidade e reforça o perigoso estereótipo de que atores não ocidentais não podem ser responsabilizados pelos mesmos padrões éticos que os europeus e seus descendentes intelectuais.
A Distorção Midiática e a Narrativa do Hamas
O viés da mídia fica evidente na maneira como ela minimiza as piores atrocidades do Hamas enquanto amplifica o sofrimento palestino — muitas vezes sem fornecer contexto. As reportagens frequentemente retratam as respostas militares de Israel como agressão, ignorando o fato de que o Hamas instala sua infraestrutura militar em áreas civis, usa escudos humanos e comete atrocidades como assassinatos em massa, estupros e sequestros. Ao não reconhecer a natureza ideológica e antissemita das ações do Hamas, a mídia ocidental reforça uma narrativa que trata vidas judaicas como menos valiosas e Israel como o agressor perpétuo, enquanto os "palestinos animalescos" seriam incapazes de agir por si mesmos, apenas reagindo instintivamente, pois não seriam plenamente desenvolvidos como seres humanos.
As Consequências Perigosas Dessa Narrativa
Ao normalizar o terrorismo contra judeus, a mídia e as elites intelectuais ocidentais criam um ambiente em que ataques contra Israel não apenas são tolerados, mas ideologicamente justificados. Isso não afeta apenas Israel — fortalece organizações terroristas ao redor do mundo ao sinalizar que a violência contra judeus sempre encontrará racionalização simpática no discurso ocidental; e não apenas os judeus serão vítimas de tais atos de ódio.
Conclusão
Embora a teoria do "bom selvagem" de Rousseau tenha influenciado o viés da mídia, no caso de Israel, ela está sendo usada apenas como um suporte para justificar um preconceito muito mais antigo e insidioso: o antissemitismo. O tratamento dado ao Hamas pela mídia não é apenas um fracasso intelectual — é um fracasso moral. Enquanto as elites ocidentais não abandonarem esse arcabouço ideológico e reconhecerem todos os indivíduos como agentes morais plenamente responsáveis, continuarão reforçando uma visão de mundo em que as vidas judaicas (e de outros) são consideradas descartáveis. Somente ao desafiar esses vieses será possível ter um discurso honesto e justo sobre o conflito Israel-Palestina e sobre o racismo profundo que ainda permeia intelectuais enraizados na filosofia europeia, especialmente a rousseauniana.
* Sonia Bloomfield é bacharel em Geografia e Mestre (UNB) e Ph.D. (Catholic Universuty of America) em Antropologia Sócio-Cultural.
Isso explica apenas parte da questao. Como a Prof Bloomfield explica o fato de que essas mesmas elites europeias tenham foco seletivo em Israel e nao manifestam o mesmo interesse nas injustiças presentea mundo afora como o drama dos curdos e a agressao turca, o genocidio do povo sirio sunita, sudao, agressao continuada ao povo venezuelano por um presidente e asseclas bolivarianos ligados ao narcotrafico, a sequestro do libano pelo Hizbollah e as politicas agressoras do Iran?
Impressionante como a "elite intelectual " sempre se suicida.